Alguém entendeu o Federal Reserve? O mercado, não
O Federal Reserve gerou manchetes esta semana, mas para muitos observadores, a grande notícia ficou escondida.
Os investidores se perguntam há meses quando o Banco Central dos EUA começaria a reduzir suas compras gigantescas de ativos. Quando o presidente do BC, Jerome Powell, divulgou na quarta-feira que o debate sobre a retirada de estímulos estava começando, o anúncio foi ofuscado pela surpresa de que as autoridades haviam antecipado o cronograma e ritmo projetados para ass nos juros.
No dia seguinte, as atenções se voltaram para o timing da retirada (conhecida como tapering) e para as dúvidas sobre o motivo de o Fed ter escolhido como ferramenta para sinalizar o começo do fim dos estímulos emergenciais o gráfico de pontos (dot plot), que apresenta trimestralmente as previsões da instituição para os juros.
“Se há preocupação com a inflação, penso que a primeira coisa a fazer seria acionar o mecanismo de redução de estímulos e não de elevação de juros”, disse Roberto Perli, que já trabalhou como economista no Fed e hoje é sócio da Cornerstone Macro em Washington. “A coisa toda foi um pouco estranha.”
Durante a entrevista coletiva após a reunião do Fed, Powell fez o possível para evitar dizer quando iniciaria o processo de redução das compras de títulos. Os analistas esperam um sinal de que a mudança está para vir em agosto — no encontro anual do Fed em Jackson Hole, no estado de Wyoming — ou setembro. O anúncio em si viria antes do final do ano. É o mesmo que os analistas previam antes da reunião do BC esta semana.
O comandante do Fed também minimizou a sinalização oriunda do gráfico de pontos, pedindo que fosse interpretado com ceticismo. O gráfico surpreendeu ao mostrar que os representantes da instituição agora preveem dois acréscimos nos juros em 2023, sendo que não esperavam nenhum ajuste três meses atrás.
As projeções trimestrais mostraram que 13 dos 18 integrantes do grupo estimam pelo menos um aumento de taxa até o final de 2023, comparado a sete pessoas em março. Onze representantes projetam pelo menos dois aumentos até o final daquele ano. Sete deles veem mudança já em 2022, comparado a quatro no levantamento anterior.
“Na verdade, não discutimos se é adequado iniciar a alta em qualquer ano específico porque discutir isso agora seria bastante prematuro”, disse Powell aos repórteres.
Não é garantido que Powell estará no cargo quando chegar a hora de subir os juros. Seu mandato termina em fevereiro e o presidente Joe Biden decidirá se pede que ele fique por mais quatro anos ou escolhe outra pessoa.
A perspectiva mais agressiva para os juros pode afetar o cronograma de retirada de estímulos. Espera-se que o Fed repita o que fez na última vez que diminuiu as compras de títulos, completando o processo antes de subir os juros. Mas falta clareza.
Michael Gapen, economista-chefe do Barclays para os EUA, viu com estranheza a declaração do comitê de política monetária de que havia progresso suficiente em direção às metas para prever um aperto de juros em 2023, ao mesmo tempo em que “não pode dizer se a retirada de estímulos está chegando ou se esta decisão está próxima”.