Algodão: alongamento dos embarques impacta fluxo de caixa, eleva custos e pesa na safra 20/21
Como nada os produtores de algodão podem fazer para se protegerem das mínimas de preços internacionais da próxima safra, a não ser torcer para as economias dos compradores de roupas asiáticas avançarem, um dos desafios para muitos exportadores é gerir o comprometimento do fluxo de caixa atual. E o que isso adiciona.
Os importadores estão pedindo alongamento dos embarques da safra atual e, junto com a parcelização dos volumes entregues, as divisas chegam agora aprazadas nos valores correspondentes.
Não está havendo calote, segundo a Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa), e confirmado pelo conselheiro da Terra Santa Agro (TESA3), Arlindo Moura, mas complicou um pouco mais.
Além da derrubada do planejamento das empresas que esperavam o encaixe total dos contratos fixados, em linha com suas obrigações, vieram novos custos e um pouco mais de dúvida sobre as intenções para o próximo ciclo.
Com a colheita acelerando acima dos 40%, Fernando Rati, gestor de sustentabilidade e mercado da entidade, diz que os produtores agora precisam armazenar mais do que o previsto. Embora esse carregamento de estoques foi aliviado com o aumento do preço referência para liquidação do financiamento oferecido para essa finalidade, como trouxe Money Times, no Brasil esse gargalo da logística é quase sempre fora da fazenda. Vai ter que ser pago.
Pré-pandemia, quando boa parte dos embarques nacionais foi fechada entre 73 e 76 centavos de dólar por libra-peso – a Terra Santa fixou entre 75 e 76 c/lp – a demanda global avaliada era de 26 milhões de toneladas. Perdeu 4 milhões/t.
Área menor
E os estoques globais, de acordo com Rati, subiram 20%. Num cenário otimista, já estão também em 22 milhões/t. “Tão otimista quanto a previsão de demanda para o ciclo 20/21, em 23 milhões/t”, pontua. Enquanto isso, as telas curtas e longas da bolsa de futuros de Nova York estão entre 63 e 65 c/lp (outubro 21 já recua para 62 c/lp).
O Brasil tira na safra atual em torno de 2,9 milhões/t (pluma e caroço) e exporta entre 1,9 e 2 milhões/t de plumas, números que a Abrapa deverá fechar nos próximos dias.
Com as dificuldades do cenário, pode-se pensar em uma redução do plantio para 20/21. Na Bahia, segundo maior produtor, com um ciclo produtivo apenas, poderá ser de 10% sobre os 313,5 mil hectares do atual. No Mato Grosso, onde a safra de inverno concorre com o milho, talvez 5% de queda ante os 1,16 milhão/ha, avalia Arlindo Moura, que trocou a presidência por uma cadeira do Conselho da Terra Santa Agro e também já presidiu a Abrapa.
Programação das exportações
A Terra Santa, no entanto, vai manter os 45 mil/ha (colherá 50 mil/t, aproximadamente agora), ao passo que a Santa Colomba, da qual Moura é sócio, já decidiu dobrar a área para 8 mil/ha, seguindo a toada desde quando entrou no negócio com 2 mil/ha, há duas safras.
No cenário do algodão, a pandemia e a parada forçada e brutal das economias reforçaram muito da inflexibilidade da fibra em termos de uso e, portanto, dos canais de venda, na comparação com as commodities alimentícias, como concorda Fernando Rati, o executivo da Abrapa.
Mas também destaca uma necessidade que os produtores brasileiros já estavam sentindo. E o caso da repactuação dos contratos de exportações atuais só veio reforçar.
Na safra atual, 80% do algodão já foi negociado. Para a safra 20/21, 30% do volume já estão preparados para exportação.
“Vamos ter que nos acostumar a entregar a pluma quase que o ano inteiro, como os importadores estão exigindo há tempos”, afirma Arlindo Moura, para quem as exportações praticamente se encerram costumeiramente em dezembro.
Depois que o Brasil entrou no primeiro time dos fornecedores, atrás apenas dos Estados Unidos, saindo em pouco tempo das 1 milhão/t, e conquistando mercados firmes na Ásia – além de China, outros hoje mais emergentes, como Bangladesh e Vietnã -, essa tendência veio para ficar.
Hoje, acentua o produtor da Terra Santa e da Santa Colamba, o algodão responde por 40% do consumo, e a fibra sintética já está nos 60% de share, quando a demanda global pela fibra natural fica atrás produção depois de três anos acima.