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Alexsandro Nishimura: Nem touro que reluz como ouro segura um bear market

23 nov 2021, 18:14 - atualizado em 23 nov 2021, 18:40
Touro de Ouro da B3
(Imagem: Divulgação/B3)

Provavelmente você já se deparou com alguma matéria sobre a instalação da escultura do touro de ouro em frente à B3, em clara inspiração no símbolo do capitalismo norte-americano posicionado próximo da Bolsa de Nova York. Outro fato que você também deve ter acompanhado é a contínua queda do Ibovespa, principal indicador do mercado acionário brasileiro. As manchetes abaixo retratam a ciranda que o investidor vem enfrentando neste ano:

(Imagem: Reprodução/ Money Times)
(Imagem: Reprodução/ Money Times)

Pouco mais de cinco meses separam essas manchetes, que retratam sentimentos tão opostos e deixam saudade nos investidores. O Ibovespa registrou o último recorde de fechamento em 7 de junho, aos 130.776 pontos. O otimismo com a recuperação econômica proporcionada pelo avanço da vacinação e a perspectiva favorável para a agenda de reformas guiavam o mercado acionário brasileiro. Naquele momento, as projeções apontavam para o Ibovespa ao redor dos 145 mil pontos no final de 2021.

De lá para cá o cenário foi se alterando, ora por motivos externos, mas principalmente por nossas próprias mazelas. Proposta de reforma do Imposto de Renda com tributação de dividendos, briga entre Poderes, avanço da inflação e o consequente aperto monetário que deve levar a Selic a dois dígitos. Por fim, e ainda sem definição, temos as discussões para o pagamento do Auxílio Brasil, com as necessidades políticas provocando mexidas em arcabouços bem quistos pelo mercado, como o Teto dos Gastos.

Externamente, os riscos se concentraram nas dúvidas sobre quando o Fed iniciará o ciclo de aperto monetário, enquanto da China vieram as intervenções regulatórias sobre alguns setores e, por último, os temores quanto à solidez de uma das gigantes do setor imobiliário do país, a Evergrande. Mas mesmo com estas incertezas, as bolsas estrangeiras seguem em alta, com o S&P 500 enfileirando recordes.

Já por aqui, no final de outubro, o Ibovespa entrou em bear market, que é configurado quando um ativo se desvaloriza mais de 20% em relação ao seu último topo. Desde então o índice passou a oscilar numa estreita faixa de até 4 mil pontos acima, mas agora opera à beira do suporte apontado por muitos analistas, que enxergam o patamar de 102 mil pontos como um divisor de águas e a última linha de defesa dos compradores para tentar alguma reação do mercado.

Não adiantou nem colocar um touro de ouro em frente à B3. Simbolismos à parte, nosso problema é estrutural, econômico, social e político. Acredito que todos estes problemas já são amplamente debatidos e não vou me alongar nos motivos que nos levaram a operar na contramão do mundo, pois enquanto o S&P, por exemplo, registrava recordes atrás de recordes, o Ibovespa vem descendo a ladeira.

No rastro do urso

Fiz um levantamento sobre as últimas vezes em que o Ibovespa entrou em zona de bear market desde 1994. Esta é a nona vez que o Ibovespa se desvaloriza mais de 20% após registrar um recorde histórico. Das outras oito vezes, faço algumas observações:

  • em quatro oportunidades, o índice chegou a cair mais de 50%, com a perda máxima atingindo 65%;
  • por três vezes, a perda ficou limitada a 25,6%;
  • o tempo de retorno mais rápido ao patamar recorde após ativação do bear market demorou 198 dias. O maior período de retorno foi de 3401 dias.

Abaixo, consolidei a extensão do movimento de queda e o tempo de retorno:

(Elaboração: Alexsandro Nishimura)
(Elaboração: Alexsandro Nishimura)

É interessante perceber que enxergar somente o Ibovespa pode nos deixar míopes e ignorar as oportunidades que o mercado oferece. Por exemplo, durante este mesmo período entre o último topo do índice e o fechamento de 18 de novembro, 22 ações que compõem o próprio Ibovespa atingiram suas máximas históricas.

Além disso, durante este período, 10 ações do Ibovespa acumulam ganhos, com destaque para Marfrig (+51,24%) e JBS (+33,07%). Por outro lado, tem ação que perdeu mais da metade do seu valor, casos de VIIA3 (-61,91%) e MGLU3 (-56,75%). Isto me faz lembrar a importância do stock picking, que é a seleção de ações que o investidor acredita no futuro rendimento acima da média. Ambos os extremos trazem características e fundamentos que justificam os desempenhos. De maneira geral, os frigoríficos surfaram a onda de valorização das proteínas, enquanto as varejistas foram impactadas pela queda do poder aquisitivo da população.

Veja abaixo as ações do Ibovespa e seus desempenhos em relação à suas máximas históricas e a 7 de junho de 2021, quando o Ibovespa registrou seu último recorde de fechamento:

(Elaboração: Alexsandro Nishimura)

Ah, já estamos há 168 dias do último recorde de fechamento do Ibovespa, o bear market foi iniciado em 29 de outubro e a contagem segue…

Alexsandro Nishimura, CFP, é Economista, Head de Conteúdo e sócio da BRA, escritório credenciado da XP Investimentos. É formado pela UFF e possui MBA em Finanças pelo IBMEC. É planejador financeiro certificado (CFP®️) e responsável pela produção e distribuição de conteúdo aos clientes da BRA. Atua no mercado financeiro desde 2005, dedicado à produção de conteúdo para investidores pessoa física. Iniciou carreira na área de consultoria, na Lopes Filho & Associados, onde atuou como analista de investimentos, montagem de carteiras recomendadas e análise de fundos de investimentos imobiliários. Foi Head de Conteúdo da MyCAP Investimentos, operação brasileira dedicada à pessoa física da maior corretora do mundo, a TP ICAP, em que era o responsável pelos departamentos de Research e Marketing.