Alex Nascimento: o futuro do bitcoin e das stablecoins após o halving
O terceiro halving do Bitcoin está apenas a alguns dias de acontecer. Previsto para o dia 12 de maio, o evento reduzirá, pela metade, as recompensas do bloco de mineração de 12,5 para 6,25 bitcoins.
A taxa de inflação anual da rede do BTC será reduzida de cerca de 3,6% para 1,8%, o que representa um intervalo notável, pois coloca a inflação do BTC muito abaixo da meta definida de 4% para o Brasil em 2020, e a do Fed, banco central americano, de 2% ao ano.
Historicamente, os eventos de halving do Bitcoin, que ocorreram duas vezes nos últimos 11 anos, foram seguidos por um aumento expressivo no preço do ativo criptografado.
O primeiro halving ocorreu no final de 2012 e o bitcoin teve uma valorização de 9.200%; o segundo halving, em julho de 2016, viu o Bitcoin apreciar 2.900% para atingir seu recorde histórico de US$ 20.089 – 18 meses após o segundo halving.
No entanto, é muito difícil prever o que vai acontecer a partir de informações estatísticas e, considerando a crise da COVID-19, este é um ambiente macroeconômico completamente diferente para o próximo halving.
Há inúmeras hipóteses sobre o que pode acontecer com o preço do bitcoin depois do terceiro halving.
É importante lembrar que o terceiro halving já vem sendo antecipado e discutido amplamente, não só por mineradores, mas também por investidores institucionais, dando aos mineradores uma ampla oportunidade de planejar e interagir com o mercado de maneira mais eficiente do que no passado.
Vou apresentar três possíveis cenários.
Cenário A
Uma tese muito comum entre especialistas é a de que, meses depois do halving, espera-se que a maioria dos mineradores de grande porte tenham feito os upgrades necessários a seus equipamentos para se manterem economicamente sustentáveis.
Assim, mineradores menores ou menos eficientes podem ser eliminados devido à obsolescência de seus equipamentos.
Quando a redução da recompensa por bloco cai pela metade (halving) junto com a ausência de um aumento significativo no preço do BTC, isso garante a obsolescência imediata de equipamentos de mineração de gerações anteriores e a falência, em curto prazo, de mineradores de pequeno porte.
Por consequência, o grupo de mineradoras que atualiza seus equipamentos para hardwares mais modernos e eficientes é beneficiado com uma redução na base de custos gerais de operação devido à redução da dificuldade da rede Bitcoin (quanto menos players, menor é a competição para a geração dos blocos), permitindo que mineradores produzam mais e vendam menos.
Essa redução no número de players no mercado e escassez no lado da oferta pode, a médio e longo prazo, impactar positivamente o preço do bitcoin.
Cenário B
Uma das principais hipóteses é que a volatilidade diária entre 1% e 5% irá se manter estável e que, provavelmente, a redução na recompensa do bloco não causará grandes alterações no preço da criptomoeda, visto que hoje as negociações de BTC em mercados futuros minimizam as da volatilidade exacerbada do ativo durante períodos como o do halving.
Embora possa haver uma pressão de curto prazo nos preços, à medida que os mineradores mergulham nas suas reservas de BTC para cobrir eventuais perdas de receita no curto prazo, essa pressão deve ser bem mais equilibrada do que a observada nos halvings anteriores.
Cenário C
Independente da eficiência de equipamentos mais modernos, o halving, por definição, dobra o custo de produção existente de cada minerador.
Quando os mineradores estão sujeitos a preços de bitcoin abaixo dos níveis de custo de produção, são forçados a vender, não apenas todas as moedas que produzem, mas também suas reservas de bitcoin para pagarem pelos custos operacionais, causando pressão de venda adicional e um aumento na oferta de bitcoins no mercado.
Isso nos leva ao terceiro cenário, que resulta na pressão de venda dos mineradores em geral, a curto e médio prazo, e na queda do preço do bitcoin até a criptomoeda encontrar um novo equilíbrio de custo de produção e demanda de mercado.
Isso pode muito bem acontecer caso a redução na produção de bitcoins por bloco não for equilibrada rapidamente com um aumento na demanda de mercado e, consequentemente, uma alta no preço da criptomoeda no curto prazo.
O bitcoin foi criado como uma resposta ao controle opressor, fiscal e monetário do sistema financeiro. Logo, tem as propriedades de um ativo seguro que deve servir como um meio contra a inflação, semelhante ao ouro.
Para cumprir com sua promessa, o bitcoin deve emergir após a crise como uma alternativa segura para moedas, cujos valores estão corroendo rapidamente.
No momento dos dois últimos eventos de halving, o bitcoin era um ativo com uma negociação digital complexa, com transações não regulamentadas e com práticas de segurança questionáveis.
Conforme mais pessoas adquiriram conhecimento sobre a criptomoeda, além de principais bancos e empresas de tecnologia lutarem para emitir suas próprias moedas digitais, o bitcoin se tornou um nome familiar e a criptomoeda se tornou mais aceita no mercado mundial.
Essa aceitação do bitcoin resultou em um crescimento de diferentes criptomoedas, as altcoins (do inglês “alternative coins to bitcoin”, “criptomoedas alternativas ao bitcoin”), como é o caso das stablecoins, que servem para mitigar a volatilidade diária do bitcoin e de outras moedas criptografadas.
Recentemente, o mercado apresentou uma demanda curiosa de stablecoins devido à incerteza gerada pela pandemia global da COVID-19. Nas últimas semanas, sua oferta total atingiu uma alta histórica de aproximadamente US$7,5 bilhões — com a demanda por tether (USDT) e USD Coin (USDC) dentre outras.
Com juros praticamente negativos mundo afora, um aumento na injeção de dólares americanos no mercado e um derretimento do valor das moedas de mercados emergentes, esse crescimento na demanda por stablecoins demonstra uma busca internacional por uma nova classe de ativos alternativos, não correlacionados a possíveis agendas políticas.
Ironicamente, Christine Lagarde, presidente do Banco Central Europeu (BCE) detalhou esse potencial desenvolvimento em 2017, junto ao Fundo Monetário Internacional (FMI).
Stablecoins operam com características semelhantes ao eurodólar, porém são extremamente mais acessíveis para a maioria das pessoas e empresas estrangeiras, além de garantir a rápida liquidação, sem a necessidade de intermediários.
Como stablecoins não são emitidas pelo sistema de crédito tradicional, são basicamente uma versão mais flexível do dólar, sem burocracia atrelada à troca e ao acesso a linhas de crédito.
Por natureza, são lastreadas por algum ativo real, como o ouro, que resulta nas inovadoras versões de stablecoins — tether gold (XAUT) e pax gold (PAXG).
Também têm aumentado em demanda, o que serve de evidência pois, além da corrida por dólares, as pessoas têm procurado por um estoque estável de valor contra a volatilidade dos mercados neste momento.
Isso leva à conclusão de que, por trás da potencial explosão de tokenização que estamos prestes a testemunhar, dinheiro ou ativos tokenizados se tornam amplamente mais acessíveis, escaláveis, transparentes e programáveis.
Muitas empresas, empreendedores e investidores ainda desconhecem as vantagens da tokenização de ativos reais. Porém, com poderosas ferramentas já disponíveis, um possível aumento no preço do bitcoin pós-halving, o crescimento adicional de stablecoins e o potencial da tokenização de ativos podem ser grandes tendências após a crise do coronavírus.
Assim, as pessoas naturalmente gravitarão em direção ao dinheiro mais seguro, seja o bitcoin, stablecoins ou moedas digitais emitidas por bancos centrais (CBDCs), como a criptomoeda chinesa, resultando em um crescimento do mercado como um todo e em um aumento na demanda por criptomoedas.
Alex Nascimento é professor de Blockchain & STOs na universidade americana UCLA e também é cofundador do UCLA Blockchain Lab. É autor do livro The STO Financial Revolution. Alex é um profundo conhecedor do mercado de valores mobiliários tokenizáveis e, neste artigo, tratou justamente sobre os possíveis cenários do halving e o futuro das stablecoins.