Alex Nascimento: criptomoedas em tempos de COVID-19
O mundo está enfrentado desafios inimagináveis em relação ao novo coronavírus (COVID-19) que, rapidamente, tem se alastrado e está gerando instabilidade na área da saúde e na economia global.
Para combater a desaceleração econômica, o Estados Unidos está anunciando um pacote econômico de mais de US$ 2 trilhões para injetar liquidez e amenizar o impacto do vírus na economia.
A Itália, um dos países mais afetados pela pandemia, aprovou um plano de reativação econômica de € 7,5 bilhões, e o Brasil já soma R$ 170 bilhões em gastos de um pacote anticrise.
A China, o primeiro país a ser afetado pelo COVID-19, já está injetando US$ 175 bilhões com o intuito de reaquecer a economia do país. Para frear ainda mais a proliferação do vírus, está utilizando luzes ultravioleta e altas temperaturas para desinfetar seu papel-moeda.
Dessa forma, o dinheiro somente será redistribuído para circulação, após duas semana de quarentena.
Uma que vez o papel-moeda está sofrendo uma redução na circulação, se faz necessária a criação de novas alternativas ao dinheiro em papel, o que pode aumentar ainda mais as chances de adoção em massa da moeda criptografada chinesa: o yuan digital, uma CDBC.
Líder mundial na mineração de bitcoins, a China possui umas das menores taxas de energia mundial e sedia várias das principais mineradoras de Bitcoin no mundo, como Bitmain e Ebang.
Aparentemente, a mineração não corre o risco de um colapso durante a pandemia, uma vez que, sendo baseada em tecnologia descentralizada, a indústria naturalmente não possui muitas oportunidades de emprego “on-site”, consequentemente não necessitando de muito contato pessoal.
Independente do derretimento global do mercado de investimentos no ultimo mês, baseado no seu posicionamento de ativo descorrelacionado a crises políticas e econômicas, os ativos digitais (criptomoedas) têm gerado um maior interesse das pessoas durante a crise do COVID-19.
Esse interesse exponencial pode ser validado através do aumento no volume de buscas em sites como Google e Baidu (o site de busca mais popular da Ásia), onde termos como “bitcoin” e “criptomoeda” recentemente atingiram picos de pesquisa.
Esse aumento no interesse das massas por criptoativos também está em linha com o aumento de usuários e de volumes de negociação em bolsa de criptomoedas mundo afora.
Durante a crise da pandemia, ocorreu uma queda de aproximadamente 50% no valor do bitcoin, alcançando seu menor patamar desde março de 2019 (US$ 3.832).
Segundo o relatório da Chainalysis, essa queda momentânea pode ser, em grande parte, devido ao “sell-off” de traders profissionais que efetuaram cerca de 70% de todas as transações de bitcoin durante os dias de queda (transações entre dez e mil BTC durante esse período de queda brusca).
Entretanto, no início do mês, somente 5% de todo o bitcoin disponível para bolsas de criptomoedas foi transacionado, representando um movimento positivo no mercado criptográfico e um posicionamento de longo prazo para a maioria de “HODLers”.
Consequentemente, em uma questão de dias, o bitcoin retomou a valorização, demonstrando que esses ativos digitais são capazes de recuperar seu valor rapidamente.
Em poucas semanas, atingiu o valor de US$ 7.302, mesmo em um período de economia instável e em que os preços de ações têm registrado, diariamente, assombrosas quedas.
Em tempos de economia mundial altamente volátil, o mercado têm mostrado maior adoção da tese do bitcoin como ativo descorrelacionado e muitos países estão começando a reconhecer as moedas virtuais como forma legítima de dinheiro e investimentos em suas jurisdições:
– Estados Unidos: a Lei de Moedas Criptografadas de 2020 propõe identificar as classes dos ativos digitais, sua tecnologia subjacente e os órgãos reguladores de cada categoria de ativo virtual;
– França: o Tribunal Comercial de Nanterre, após uma disputa judicial, reconheceu o bitcoin como um ativo fungível intercambiável, tornando-o numa forma genuína de dinheiro, assim como empréstimos criptográficos;
– Alemanha: a Autoridade Federal de Supervisão Financeira (BaFin) reconheceu as moedas digitais como um recurso monetário legítimo e serviços de criptografia como instituições jurídicas de serviços financeiros, sendo submetidas a regulamentações fiscais;
– Coreia do Sul: a Assembleia Nacional da Coreia do Sul se tornou favorável à propriedade e ao comércio de moedas virtuais. Essa ação promove uma legislação mais clara, segurança jurídica, além de conquistar novos investimentos;
– Índia: a Suprema Corte da Índia revogou o embargo do Banco Central Indiano de realizar transações com empresas de criptomoedas.
Assim, em um ambiente hostil para o manejo de moeda fiduciária de mercados emergentes e de instabilidade econômica mundial, a moeda virtual torna-se uma possibilidade de captar investimentos transfronteiriços atraentes.
Devido à extrema fluidez de ativos digitais, algumas instituições têm utilizado o bitcoin e outros ativos criptografados não só como veículo de investimento, mas também como ferramenta para ajudar no combate ao COVID-19, conforme está sendo feito pelas seguintes organizações e governos:
– A organização Binance Charity criou a campanha Crypto Against Covid, que já arrecadou mais de 360 mil BTC. O valor permitiu a compra de 366 mil pares de luvas, 56,8 mil máscaras, nove esterilizadores, 173 barris de desinfetantes, 5,28 mil desinfetantes para as mãos, 20 mil kits de testes, 7,85 mil roupas de proteção, 20 mil óculos de proteção, 388 concentrados de oxigênio e mil lâmpadas germicidas, sendo distribuídos a 300 hospitais nas províncias de Hubei, Sichuan, Guangxi e Xangai;
– A Cruz Vermelha, em parceria com a Helperbit, criou um angariador de fundos de bitcoin. Com o valor arrecadado, será erguido um posto médico para a realização de triagem de casos do COVID-19 na Itália. O valor excedente será utilizado para comprar materiais de proteção para profissionais da saúde;
– Nos EUA, o “dólar digital”, proposto pelo senado americano, sustentaria famílias durante a crise do COVID-19. A moeda digital seria enviada automaticamente para o telefone celular ou e-mail dos cidadãos com segurança e eficiência. Devido à velocidade de transação do dólar digital, a política fiscal e monetária se tornaria mais eficaz e as transações seriam mais rápidas, contribuindo para a aceleração econômica — o que não ocorreu em 2008, já que a colaboração do governo levou de três a nove semanas para chegar aos contribuintes;
– A Exchange Brasileira Mercado Bitcoin lançou uma campanha para arrecadar doações de bitcoins e ajudar o Hospital de Cirurgia de Sergipe a combater o COVID-19. A meta é arrecadar R$ 360 mil e os depósitos podem ser feitos em unidades inteiras ou frações de BTC diretamente na carteira pública: 38zV1uySXgv4NLueuJxpXsf3sABR6VFBQs.
Essas alterações e esses sobressaltos no mercado financeiro e de criptomoedas, além dos estímulos econômicos mundiais, poderão nos levar a uma nova economia. Porém, no médio para longo prazo, o mercado de criptomoedas tem atingido um retorno de 113% ao ano e uma volatilidade anual de 85% desde 2016.
Mesmo tendo sofrendo quedas drásticas no mês de março de 2020, o bitcoin tem se tornado tão seguro quanto os ativos mais tradicionais.
As novas legislações têm tornado o universo criptográfico judicialmente legítimo, estabelecendo até mesmo um relacionamento com instituições financeiras tradicionais, como a NYSE, assim comprovando seu reconhecimento e sendo fundamentado e utilizado em um momento de crise mundial.
Certamente, o bitcoin e demais criptomoedas não serão extintas pela pandemia do COVID-19 e, possivelmente, estarão adquirindo alta demanda no mundo durante e pós-coronavírus.
Alex Nascimento é professor de Blockchain & STOs na universidade americana UCLA e também é cofundador do UCLA Blockchain Lab. É autor do livro The STO Financial Revolution. Alex é um profundo conhecedor do mercado de valores mobiliários tokenizáveis e, neste artigo, tratou justamente sobre o panorama atual de criptomoedas pelo mundo durante a pandemia do COVID-19.