Política

Aeronautas pedem inclusão da categoria nas regras de aposentadoria especial

03 mar 2020, 16:55 - atualizado em 03 mar 2020, 16:55
O PLP regulamenta a aposentadoria especial àqueles segurados do Regime Geral que exercem atividades expostos a agentes nocivos à saúde (Imagem:Geraldo Magela/Agência Senado)

Representantes de pilotos, copilotos e comissários de bordo pediram, em audiência da Comissão de Direitos Humanos (CDH) nesta terça-feira (3), a inclusão dos aeronautas na lista de profissões com direito a aposentadorias especiais por exposição a agentes nocivos químicos, físicos e biológicos prejudiciais à saúde, ou associação desses agentes (PLP 245/2019).

O PLP regulamenta a aposentadoria especial àqueles segurados do Regime Geral que exercem atividades expostos a agentes nocivos à saúde, bem como aqueles que põem em risco sua integridade física pelo perigo inerente à profissão.

Daniel Bianco, vice-presidente para a América do Sul da Organização Mundial de Pilotos de Linha Aérea (Ifalpa), calculou que os seis mil pilotos que trabalham no Brasil representam 0,006% na população geral de trabalhadores, de cerca de 100 milhões.

Ele contou que a própria idade é um fator de risco para a atividade dos pilotos, pela defasagem natural que a profissão causa nos sentidos: visão, audição e no equilíbrio.

Além disso, Bianco apontou que há perda cognitiva e de tempo de reação.

— Tudo isso impacta a segurança do voo — afirmou.

As constantes mudanças de fuso horário e o trabalho noturno deterioram o metabolismo, segundo ele. Há também o aumento dos problemas cardiovasculares e de cânceres e o fato de pilotos e comissários de bordo serem os profissionais mais expostos à radiação solar, que aumenta conforme a altitude do voo.

— Também temos as alterações de pressurização, oxigênio e umidade das cabines.

Esse ponto foi o foco do presidente da Sociedade Brasileira de Medicina Aeroespacial, Flávio Suto, na sua exposição. Ele acrescentou o ruído, as vibrações de corpo inteiro e as constantes diferenças atmosféricas na decolagem e aterrissagem como fatores de preocupação.

Também lembrou que os comissários de bordo estão sujeitos às mesmas condições dos pilotos e a elas são submetidos ao longo do horário de trabalho.

— A exposição constante a uma baixa pressão atmosférica, chamada de hipobárica, causa fadiga, doenças neurológicas, cardiovasculares e descompressivas. Na camada onde voam os aviões, o ar é muito rarefeito, então a aeronave capta o ar externo, aquece, filtra e vai para dentro do espaço confinado da cabine, sendo um ar frio e seco — destacou o médico do trabalho.

CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADE

Outros países

Daniel Bianco, da Ifalpa, citou como outros países lidam com as peculiaridades da aposentadoria de aeronautas. De acordo com ele, na Argentina a aposentadoria geral é de 60 anos para mulheres e 65 para homens, com 30 anos no mínimo de contribuição — regra semelhante à brasileira até a reforma da Previdência.

Segundo ele, as estatísticas colocam a expectativa de vida dos pilotos argentinos em 68 anos. Eles têm regime especial de aposentadoria: 50 anos de idade e 30 anos de serviço, sendo um ano de serviço reduzido a cada 400 horas voadas.

Nos Estados Unidos é adotado um regime misto entre o geral e o acordo coletivo da empresa (Imagem: Unsplash/@viniciusamano)

No caso do Uruguai, a regra geral é aposentadoria aos 60 anos (homens e mulheres), mas, após dez anos no ofício, pilotos e copilotos recebem bonificação de sete anos por cada cinco anos trabalhados a bordo de aeronaves de empresas nacionais.

Já nos Estados Unidos é adotado um regime misto entre o geral e o acordo coletivo da empresa. Na regra geral, quanto mais a pessoa trabalha, mais próxima da integralidade ela está.

A idade para integralidade varia de 62 a 70 anos. No caso dos aeronautas, não há idade mínima de aposentadoria, mas o máximo é 65 anos.

O piloto tem então duas fontes de renda da aposentadoria: aquela paga pelo governo e outra paga pelo fundo de previdência privada.

No Canadá, não há idade mínima: quanto mais contribuir, mais o trabalhador vai receber de aposentadoria. Naquele país a idade média de aposentadoria é de 63 anos, atingindo-se a integralidade com 65.

Não há idade mínima para os pilotos se aposentarem também, mas na Air Canada — a maior empresa de aviação canadense — o tempo de aposentadoria é em média, de 50 anos de idade e 19 anos de serviço.

Já na Espanha, a regra geral é aposentadoria a partir de 65 anos, desde que haja 38 anos e meio de contribuição. No caso dos aeronautas, o tempo de serviço na função reduz o tempo de aposentadoria.

Depois de 25 anos de serviço, o tripulante pode se aposentar sem perder a integralidade. No vizinho Portugal, a regra geral de 66 anos e três meses é reduzida para 65 anos, no caso dos que trabalharam pelo menos 15 anos em aeronaves.

A Bélgica, que vem gradativamente aumentando a idade para aposentadoria, reduz atualmente em dez anos a idade mínima de tripulantes de voo, sendo que pilotos e copilotos precisam comprovar 20 anos de serviço na cabine, enquanto os comissários, 23.

— Como se vê, no mundo inteiro não se buscam privilégios, apenas o reconhecimento de um trabalho que custa a saúde do profissional e que é estratégico e vital para os países e as sociedades — sintetizou Daniel Bianco.

Regulamentação

A audiência foi presidida pelo senador Paulo Paim (PT-RS). Ele lembrou que uma das maiores exigências de quem se opôs à PEC da Reforma da Previdência (PEC 6/2019, transformada na Emenda Constitucional 103/2019) foi a volta da previsão de aposentadoria especial para profissões que, de alguma forma, prejudicam sistematicamente a saúde dos profissionais — que havia sido tirada pela PEC. Paim disse que agora é preciso regulamentar cada caso particular para “dar direito a quem tem direito”.

O senador Esperidião Amin (PP-SC), relator do projeto que regulamenta aposentadorias especiais (PLP 245/2019) na Comissão de Assuntos Econômicos, afirmou que trazer segurança jurídica à aposentadoria dos aeronautas vai poupar a judicialização.

De acordo com ele, cerca de 85% dos pedidos de aposentadoria especial estão na Justiça para serem concedidos.

A advogada Márcia Furtado, representante do Sindicato Nacional dos Aeronautas (SNA), ressaltou que “a aposentadoria especial é uma forma de compensação para quem trabalhou com agentes nocivos à saúde”.

Ela explicou que existe um custo alto pela judicialização dos pedidos de aposentadoria especial. Só em 2019, segundo a advogada, mais de 300 aeronautas recorreram ao sindicato pedindo ajuda para se aposentarem. Fora isso, há os advogados privados conduzindo ações dos seus clientes.

— Esse processo leva uns oito anos. O perito é pago, valores vão se acumulando com juros sobre juros e, quando sai a aposentadoria, o benefício é pago de maneira retroativa. Isso é um custo alto para a União. Melhor seria uma aposentadoria administrativa — sugeriu.

O presidente do SNA também estava na reunião. Ondino Neto frisou que o que está em questão não é apenas a aposentadoria especial de uma categoria, mas a segurança no transporte de 120 milhões de passageiros transportados todos os anos no Brasil.

— Estamos falando de um transporte seguro, por isso todas as vezes que vemos um fator de risco, ele precisa ser eliminado.