Abiove lança sistema para evitar ‘defaults’ no cumprimento de contratos de soja
A indústria de soja do Brasil anunciou nesta sexta-feira que está operando com um novo sistema para monitorar o cumprimento de contratos por produtores que venderam como nunca antecipadamente a sua safra e que agora, com preços maiores no mercado, estão buscando renegociar os termos.
A inadimplência dos contratos no tradicional esquema de vendas antecipadas do Brasil é relativamente pequena, afirmou o presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove), André Nassar.
Mas a preocupação de um problema maior existe, diante das vendas recordes antecipadas na safra 2020/21 que atingiam cerca de 60% da produção prevista em janeiro, antes mesmo de a colheita começar e da grande diferença de preços entre os valores fixados em contratos e os do mercado à vista.
“Não são muitos (os produtores que estão querendo romper contrato), mas está no começo da safra, pode virar muitos. A ferramenta vem para que o produtor entenda que o certo é cumprir o contrato”, disse Nassar à Reuters.
Dessa forma, a Abiove encomendou a uma companhia especializada em análise de informações para segurança das operações de crédito cujo nome não foi revelado o desenvolvimento de uma ferramenta para uso das empresas comercializadoras de soja que lhes permitirá acompanhar o adimplemento das entregas das vendas antecipadas safra 2020/21, observando todas as legislações pertinentes.
“Estamos falando de registrar algumas informações dos contratos para medir duas coisas, para que a empresa conheça o grau de exposição que está em relação ao produtor… e se houve algum tipo de inadimplemento ou ´default´. Se tiver havido, essa informação vai para base de dados e as empresas vão poder saber…”, afirmou Nassar.
As próprias empresas alimentarão diretamente a ferramenta, de forma individual e sigilosa. Elas não terão acesso ao detalhamento dos contratos de seus pares, visualizando apenas a sua própria exposição diante dos volumes totais e agregados de cada produtor.
Informações relativas a preços e valores financeiros, bem como a localização da propriedade rural, não serão alimentadas na base de dados.
Havia preocupações sobre tentativas de renegociações em novembro, já com o mercado subindo com a forte demanda da China, em meio à forte antecipação de vendas, conforme a Reuters reportou na época.
Mas, com preços atuais em mais de 160 reais por saca de 60 kg no porto de referência de Paranaguá (PR), valor que representa o dobro do contrato fechado por alguns produtores no início da temporada de comercial da safra 2020/21, a preocupação aumenta.
“É muito difícil falar da diferença de preços, teve gente que vendeu a 80, 90, 100 reais. Essa diferença… já vivemos essa experiência em 2004, houve muito ‘default’ de contrato, e em 2005 e 2006 as compradoras não fixaram, e a safra de soja não cresceu, perdeu muita liquidez…”, alertou Nassar.
Ele lembrou que o sistema de fixação antecipada de preços é bom para todos os agentes, pois “dá muita liquidez”, permite que o produtor trave custos e planeje sua safra futura, entre outros benefícios.
Nassar disse ainda que, quando os compradores acabam perdendo, não tentam renegociar contratos. “Fizemos uma avaliação de 21 anos… em 12 anos, o efeito foi inverso, o preço da época da colheita estava inferior ao preço fixado, e não houve nenhuma trading falando em romper contrato.”
Ele disse que algumas empresas já tiveram que acionar a Justiça para buscar soja na fazenda de produtor que não cumpriu o contrato.
Questionado, Nassar disse que o produtor pode pagar uma multa para renegociar contratos, mas também precisa arcar com a diferença a mercado da soja.
“Então não tem vantagem financeira, a empresa tem o direito de exigir na Justiça a precificação a mercado”, afirmou ele, ressaltando que a associação tem conhecimento de vários casos com decisão judicial favorável aos compradores.
Ele disse que, “se houver grande default”, as empresas não vão fazer negócios antecipados para o ano que vem, o que pode impactar a safra futura.
O presidente da Abiove afirmou que o risco de inadimplência não tem origem no atraso da safra, cuja colheita começou mais lenta após um plantio mais problemático por falta de chuvas.
“Não é o atraso, é principalmente produtor oportunista que quer derrubar o contrato e vender a soja mais cara.”
De acordo com Nassar, o programa recém-lançado é coordenado pela Abiove, mas está aberto à possibilidade de adesão também para empresas ligadas à Associação Nacional dos Exportadores de Cereais (Anec).