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A nova onda do modelo SaaS: como IA está transformando esse mercado

23 fev 2025, 12:00 - atualizado em 20 fev 2025, 14:44
Retrato de um jovem negro trabalhando em um computador portátil saas
A revolução do SaaS reforça tendências importantes no mercado como o open source. (iStock/gorodenkoff)

Em 2011, Marc Andreessen, fundador da a16 (um dos fundos de VC de maior prestígio no mundo) e guru da web, lançou o famoso artigo “Why Software Is Eating the World” ou “Por que o software está devorando o mundo”. Nele, Andreessen explicava como os softwares iriam permear todos os mercados da economia, transformando indústrias intensivas em infraestrutura, como varejo, telecomunicações e entretenimento.

No setor de telecomunicações, por exemplo, a Skype acabava de ser comprada na época pela Microsoft por US$ 8,5 bilhões, além de ser a empresa que mais crescia no setor. Enquanto isso, AT&T e Verizon, empresas centenárias sobreviviam transformando-se em empresas de software e fazendo parcerias com Apple ou outros fabricantes de smartphones.

Não há a menor dúvida de que o modelo desempenhou um papel crucial em toda a economia: ele libertou setores de TI de instalações em servidores locais que demandavam altos custos de set up e de armazenamento, facilitando as adequações dos sistemas às realidades específicas de cada empresa, acelerando implementações e fazendo com que o suporte pudesse ser instantâneo e online. Em 2024, o mercado de SaaS foi avaliado em mais de US$ 300 bilhões, podendo chegar a um valor de 1,32 trilhão até 2032. SaaS constitui hoje o terceiro maior custo das empresas e estima-se que ao menos 70% delas em todo o mundo utilizam algum tipo de software.

Promissor não? Bom, aparentemente até o mês passado. No final de 2024, um vídeo de Satya Nadella, CEO da Microsoft, viralizou no LinkedIn e em outros canais de comunicação da indústria de tecnologia. O motivo? Nadella, liderando a empresa que não apenas criou o modelo de software como o conhecemos, mas também o domina globalmente com 11,3% de market share, afirmou que o mercado está prestes a passar por uma transformação radical.

A previsão de Nadella é revolucionária. Ele defende que o futuro da tecnologia não será definido por softwares mais sofisticados, mas por um modelo que elimine a dependência de interfaces complexas. No lugar do SaaS tradicional, Nadella imagina um mundo onde agentes de inteligência artificial interajam diretamente com bancos de dados e sistemas, substituindo aplicativos independentes. Esses agentes de IA atuariam como orquestradores inteligentes, integrando diferentes plataformas e eliminando silos de dados. A camada de IA não discriminará quais sistemas ou bancos de dados estão sendo utilizados, mas realizará todas as operações necessárias, migrando a lógica de negócios para um nível completamente novo.

Essa visão coloca a IA como o centro nervoso dos sistemas de negócios, transformando fluxos de trabalho, tomadas de decisão e automações. Ferramentas SaaS tradicionais serão relegadas ao papel de habilitadores especializados, enquanto as empresas se tornam mais enxutas, dinâmicas e eficientes. Se um gestor, por exemplo, pede um report a uma IA, ela deveria ser capaz de traduzir a imensa massa de dados do sistema para uma análise específica, podendo até apoiar a gestão na tomada de decisão com base em criações de cenários.

As características que fizeram do SaaS um modelo bem-sucedido, como a instalação sob demanda e a escalabilidade por usuário, também levaram a uma “expansão desordenada do SaaS”. As empresas agora lutam para mapear seus gastos com software e medir o retorno sobre investimento. Após os gastos excessivos com software durante a pandemia de Covid-19, muitas empresas cortaram seus orçamentos nesse campo em até 30%. Onde deveria haver automação, agora parece haver excesso e desperdício.

Outro problema crítico no modelo atual de SaaS é a fragmentação de dados. Embora as empresas dependam de aplicativos SaaS para gerenciar processos essenciais, muitos deles não se integram de maneira eficiente. Departamentos de marketing e vendas, por exemplo, muitas vezes operam com dados sobrepostos, mas armazenados em aplicativos diferentes, resultando em dificuldades para rastrear informações precisas, lidar com dados duplicados e manter a consistência. Segundo estudo da Forrester de 2022, trabalhadores do conhecimento gastam, em média, 12 horas por semana “procurando dados” – tempo que poderia ser dedicado a atividades de maior valor agregado.

O modelo SaaS está mesmo morto ou prestes a enfrentar uma nova onda com a IA?

Os dias de hiper crescimento desenfreado de SaaS quase certamente ficaram para trás. Empresas públicas de SaaS viram suas avaliações encolherem, com empresas de SaaS de pequena capitalização apresentando desempenho significativamente inferior aos índices mais amplos do mercado em 2024. No entanto, é crucial lembrar que o mercado de SaaS é uma indústria bilionária, que vem crescendo ano a ano.

Assim como o artigo de Marc Andreessen previu o impacto do software no mundo, a visão de Satya Nadella aponta para um futuro em que a própria noção de software como conhecemos hoje será transformada. A evolução do SaaS para um modelo orientado por IA promete redefinir a maneira como as empresas interagem com dados, eliminando redundâncias, reduzindo custos e abrindo caminho para uma nova era de inovação e produtividade.

Dessa forma, como os provedores de software sobreviverão a essa nova onda? Segundo Nadella, uma das alternativas seria basear seu negócio em conectores, ou seja, plugins que possam gerar valor agregado para a jornada do usuário no sistema, por exemplo, as próprias camadas de IA, alternativas de embedded finance, como a conexão do sistema com a conta bancária do usuário, serviços de messaging, dentre outros. Com isso, não só seria possível diminuir os custos com cada um desses participantes da cadeia produtiva, como também unificar dados e análises.

O futuro é descentralizado e open source

A revolução do SaaS reforça tendências importantes no mercado como o open source, que são os modelos de distribuição de código aberto, no qual modificações no código são permitidas e fazem com que tanto o desenvolvedor quanto qualquer outra pessoa possam examinar o código para criticar e sugerir melhorias, o que eleva a qualidade e, claro, reduz vulnerabilidades ocultas.

Além disso, esse modelo ajuda a democratizar a utilização de IA desbloqueando seu verdadeiro valor: abrir caminho para que o futuro da tecnologia seja construído sobre uma base de desenvolvimento orientada pela comunidade, progresso compartilhado e liberdade de escolha.

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Cofounder & CBPO da Lerian, uma startup que desenvolve soluções financeiras open-source. Especialista em finanças e economia com bacharelado em economia pela Universidade Federal de Santa Catarina (2010); intercâmbio bilateral em Ciências Econômicas e Empresariais na University of A Coruña (2010); MBA em Gestão de Comércio Exterior e Negócios Internacionais pela Fundação Getulio Vargas (2012); MBA Executiva de Economia pela ExxonMobil Business Academy (2014); Mestre em Administração de Negócios pela Coppead UFRJ (2016) e Business Dynamics pela MIT Sloan School of Management. Atua desde 2014 no mercado financeiro e aborda temas como Banking as a Service, Open Banking, embedded finance, PIX, moedas digitais, finanças descentralizadas, fintechs, empreendedorismo feminino, entre outros.
marilyn.hahn@moneytimes.com.br
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