A equação da nova safra e a “conta que não fecha”, segundo Pedro Fernandes, diretor de agronegócio do Itaú BBA

O ciclo 2025/2026 será marcado por uma equação de margens menores para o produtor rural, segundo Pedro Fernandes, diretor de agronegócio do Itaú BBA.
“Viemos de dois anos de margens mais razoáveis e 2026 deve ser mais apertado. Se olharmos da perspectiva de crescimento da produção e área plantada, podemos ficar animados. Existe uma parcela dos agricultores que se alavancou muito em anos de bonança e que agora gera uma entropia no humor dos mercados”, disse, ao Money Times.
Mesmo com as menores margens, os níveis de inadimplência devem ficar sob controle e não vão afetar os resultados do banco.
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O executivo não abre dados detalhados sobre o assunto, mas responde: “Ela [a inadimplência] é bem mais elevada que no ano passado. Ainda assim, é controlada, o que permite que o resultado do ano seja positivo.”
A inadimplência no agro nos últimos trimestres afetou fortemente o resultado do Banco do Brasil, o principal responsável pelo crédito agrícola no país, com uma carteira superior a R$ 400 bilhões.
No caso do Itaú BBA, o agro não tem o mesmo peso, mas não deixa de ter uma participação significativa. Do total de R$ 600 bilhões da carteira do Itaú BBA, o agronegócio responde por R$ 130 bilhões, uma fatia de cerca de 20%.
Esse montante aumentou 8% em relação aos R$ 120 bilhões do ano passado, apesar dos ventos contrários da variação cambial. Além disso, desse valor total, boa parte — cerca de R$ 50 bilhões — está alocada “dentro da porteira”, com o crédito concedido diretamente a produtores rurais.
A conta que não fecha para o Itaú BBA
Para o diretor do Itaú BBA, a conta que não fecha é de quem opera com grandes volumes de terras arrendadas — ou seja, o produtor que produz na terra cedida pelo arrendador — e conta com pouco capital próprio.
“A equação financeira para quem tem muita área arrendada é negativa depois do financiamento. A margem não é suficiente para bancar o arrendamento, juros de custeio e parcelas de investimentos passados. Vimos o preço do arrendamento subindo muito em regiões com uma produtividade ainda não muito elevada”.
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No cenário de ‘boom’ para margens, muita gente arrendou terra por preços que não fazem mais sentido com os preços atuais. Como você viu aqui, o Santander também reforça que quem mais sofre no cenário atual é o arrendatário, e que o momento atual tem feito muitos produtores venderem suas terras, o que, por sua vez, comprime os valores das propriedades
“Temos uma série de infortúnios de pessoas que contam com história no agro, mas que chegaram numa equação pouco viável. Especialmente para quem não tem ativos, há muito pouca margem para construção de pontes para o futuro”, completa Fernandes.
O que levou ao momento atual?
Fernandes explica que entrar num período de margens reduzidas com juros altos foi o que levou ao aumento das recuperações judiciais e deterioração de indicadores de atraso dos bancos.
Esse movimento acontece porque “uma parcela dos agricultores se alavancou muito em anos de bonança”.
“Ocorreu uma frustração em termos de fluxo de caixa, ou seja, o produtor achou que ia se desalavancar em dois anos, mas acabou precisando alongar seus endividamentos, porque não vende mais a soja por R$ 200/saca”, diz ele, referindo-se ao valor atingido pela commodity no começo de 2022. Hoje, a saca da soja gira em torno de R$ 138.
A Resolução 4966 e seus impactos
Acima de tudo isso, a Resolução 4966 do Banco Central, que entrou em vigor em janeiro, endureceu as normas contábeis e de provisão de crédito dos bancos.
“Essa é uma resolução de 2021. Obviamente que ela passa a valer num período mais desafiador, mas os bancos tiveram todo o tempo para se adaptar. Ninguém acordou em janeiro de 2025 e disse: ‘Vou virar o tabuleiro’. Tivemos quatro anos para essa transição”.
Fernandes explica que o banco já trabalhava com o modelo de perda esperada e que a principal mudança é que o Itaú BBA deixou de classificar o risco com base em ratings mínimos do BC.
“Não foi um grande desafio para nós. Quando olhamos o balanço do banco Itaú como um todo, tivemos um nível de ajuste muito pequeno no nosso patrimônio líquido de 2024 para 2025. Vimos uma série de bancos que tiveram reclassificações de políticas que levaram a uma mutação do patrimônio líquido. A transição para a 4966 não foi traumatizante para nós”.
O diretor de agronegócio reforça que a grande mudança para o produtor rural fica para a tolerância nos níveis de atraso.
“A 4966 obriga a mudar a ordem das coisas e não deixar dívidas vencidas para resolver depois. Pegando o exemplo dos FIDCs, só é atraso depois de 90 dias. Com a 4966, a hora que chega nos 90 dias, o ‘boi já foi com a corda’ e o banco já é obrigado a criar uma provisão elevada, perde flexibilidade e capacidade de aumentar exposição em função da classificação de risco, por mais que a perspectiva de recebimento seja boa”.
Fernandes acredita que nova forma de conceder crédito pode ser a mudança de comportamento que é preciso para a indústria.
“Não adianta ser um torcedor do fluxo de caixa, e sim ter certeza do que vai ser pago, o que precisa ser rolado, o que a gente precisa de alternativas”.