“A culpa não é minha, eu votei no Aécio” e a volta dos que não foram
Por Caio Augusto, para o Terraço Econômico
Passados alguns dias da decisão em segundo turno que levou Jair Bolsonaro a se eleger como 38º presidente do Brasil, temos agora uma onda bastante parecida com a observada em 2014 quando Dilma Rousseff foi reeleita: quem não votou na chapa vitoriosa aderiu ao curioso movimento “A culpa não é minha, eu votei no Aécio”. Como somos o país oficial da memória curta, aos esquecidos, uma imagem para lembrar desse movimento segue abaixo:
Com a chegada de 2018, anos de ressaca político-econômica fizeram seu efeito sobre a mente do brasileiro. Estamos recém-saídos da maior crise em décadas, ocorrida no biênio 2015-2016 e, semana a semana, seguimos acompanhando a longeva Operação Lava Jato, com mais de 50 fases já efetuadas e um verdadeiro terremoto sobre as bases políticas tradicionais do país.
A “inocência” de não ter acompanhado ainda os efeitos de uma imensa investigação pode, ao menos em parte, justificar o “alívio” de alguns em não ter votado na chapa petista em 2014 e, supostamente, não ter tido culpa sobre a catástrofe econômica que se confirmou a seguir. Entretanto, mesmo esse não conhecimento não consegue justificar que alguém tenha responsabilidade ou deixe de ter em relação a uma eleição.
Por mais óbvio que pareça, em uma democracia como a brasileira leva o pleito aquele que tiver ao menos 50% + 1 dos votos válidos, seja em primeiro ou segundo turno. Este que vence, passa a governar para todos aqueles do universo eleitoral, não apenas para os que nele depositaram seu voto. Então: aqueles que votaram em Bolsonaro, aqueles que votaram branco, nulo ou que votaram na chapa de Haddad, ao final da apuração dos votos, escolheram em conjunto que Bolsonaro deveria governar.
“Não o aceito como presidente, não foi meu candidato.”
Em uma democracia, a escolha social é feita por essa maioria – não é questão de concordar ou não, mas de aceitar a democracia como ela é. Na prática, com exceção à eleições em que há margem considerável entre o candidato vencedor e o que perdeu, é uma questão de lógica que a proporção entre os que não aprovam o eleito e o aprovam possa ser próxima. No caso da eleição de 2018, então, isso fica ainda mais evidente, dado que os dois candidatos que chegaram ao segundo turno eram os dois com a maior rejeição entre os treze que disputavam.
Com poucos dias de confirmação de Bolsonaro como presidente, os fantasmas do “vou torcer pra dar errado porque não votei nele” ou “não o aceito como presidente” estão de volta. Más notícias para você que está falando ou pensando nisso: sim, ele é seu presidente e as decisões que ele vier a tomar, sejam elas boas ou ruins, valerão pra você como brasileiro. Igual ao que ocorreu com Dilma em 2014 e exatamente da mesma maneira que ocorreu e ocorrerá com todo presidente eleito em nossa democracia.
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Por enquanto, temos uma chuva de especulações sobre o que pode ser o governo de Jair Bolsonaro. Alguns nomes sendo indicados e esparsos planos – que sequer foram apresentados realmente em detalhes aos eleitores durante a campanha – começam a ser informados. No fim das contas, importarão mesmo as ações práticas a serem tomadas na transição de governo com Michel Temer e a partir de primeiro de janeiro de 2019 diretamente de Brasília.
Mesmo ainda na fase de especulações e pouco desenho do que será feito, já vemos retomado o discurso de que talvez tenhamos errado em escolher Bolsonaro como presidente – e, é claro, se não este artigo não estaria aqui, com uma boa dose de “e a culpa é sua que votou nele ou se absteve”.
Eis a realidade: pela primeira vez desde 1989 tivemos uma pulverização de candidatos com chance real de eleição. Lá, 22 chapas; aqui, 13. Tivemos sim muitas opções diferentes dos extremos representados por Bolsonaro e Haddad. Inclusive essas opções foram apresentadas em horário eleitoral e em diversos debates. Porém, a escolha feita por muitos foi a de “votar em um extremo para abolir as chances do outro”. Com essa ideia, não é surpreendente que tenhamos levado os dois extremos para o segundo turno e que, pasmem, um dos dois acabou sendo eleito.
Alguns retomarão o ponto de que somos uma jovem democracia, ainda aprendendo a fazer suas escolhas. Outros, que somos um país formado por pessoas facilmente levadas por movimento de manada eleitoral. Independente da vertente que você acredita, tenha em mente para as próximas eleições que o voto deve ser dado de olho no potencial que os candidatos podem oferecer, não na insana ideia de que “pelo menos com esse não teremos o outro”.
E, por mais duro que seja admitir, a culpa (troque por “responsabilidade”, se achar que alivia alguma coisa) de fazer essa escolha é de todos nós. Ou, melhor dizendo: toque os violinos como a orquestra do Titanic fez, mas veja que se o navio afundar, você estará junto.