100 dias

3 fatores influenciaram o dólar nos 100 primeiros dias de governo Lula; veja quais

10 abr 2023, 11:00 - atualizado em 10 abr 2023, 11:18
Dólar Luiz Inácio Lula da Silva
Dólar foi de R$ 4,94 a R$ 5,48 nos 100 primeiros dias de governo com embate entre BC e Lula, diferencial de juros e arcabouço fiscal (Imagens: Pexels, Wikimedia Commons, Ricardo Stuckert | Montagem: Mara Matos)

Os primeiros 100 dias do terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva se foram, cheios de desafios e expectativas dos investidores. O dólar abriu 2023 nas alturas, nas máximas em quase seis meses, chegando bem perto de R$ 5,50.

Mas foi perdendo força acompanhando o exterior e com o mercado doméstico mais aliviado após a posse do petista. Com isso, no início de fevereiro, a cotação da moeda norte-americana chegou ao menor nível desde julho de 2022, no surpreendente R$ 4,94.

Lá fora, Estados Unidos e Europa seguiram com a elevação de juros. Aqui, Lula passou a criticar a postura do Banco Central (BC) em relação à condução da política monetária, mantendo a taxa básica de juros (Selic) em 13,75%. E, após três meses de espera, o novo arcabouço fiscal, que substitui o teto de gastos, foi apresentado.

Entretanto, desconsiderando os efeitos externos, dois fatores pesaram na cotação da moeda norte-americana entre janeiro e esse começo de abril: a política monetária e o novo arcabouço fiscal.

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O que pesou mais no dólar em 100 dias de Lula 3?

O cientista político e sócio da Tendências Consultoria, Rafael Cortez, lembra que poucas semanas após a posse de Lula, o presidente da República iniciou uma trajetória de críticas ao presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, por manter a taxa Selic elevada em dois dígitos.

“O presidente Lula politizou a taxa de juros em diversas oportunidades, criando um tipo de confronto com o Campos Neto”, comenta. 

Segundo Cortez, isso trouxe a percepção de que uma mudança poderia ocorrer na autoridade monetária, além de receios de intervenção do governo no BC, colocando em xeque a autonomia da instituição. “Trouxe um elemento adicional de percepção de risco elevada”, acrescenta.

Entretanto, a taxa de juros mais alta foi um importante fator para manter o dólar acomodado com média de R$ 5,20 nos 100 primeiros dias. 

A economista-chefe da Veedha Investimentos, Camila Abdelmalack, chama a atenção para o fluxo de investidor estrangeiro que o Brasil vem atraindo nos últimos meses em meio ao diferencial da taxa de juros daqui e das principais economias globais, o chamado “carry trade”.

“A gente vê essa taxa de câmbio, com o dólar ali próximo dos R$ 5,00, por conta desse diferencial da taxa de juros. É um cenário de oportunidade de retorno por conta desse diferencial”, comenta. 

Segundo a economista, o mercado entende que a elevação da taxa de juros nos Estados Unidos está próxima do fim, enquanto no Brasil, não há horizonte para corte de juros. O que reforça a ideia, segundo ela, de que “nem tudo foi explicado pelo cenário doméstico” na volatilidade do dólar de janeiro ao começo de abril, tendo influência do comportamento da moeda no exterior com a elevação de juros por lá.

Em relatório especial sobre os 100 primeiros dias do governo Lula, a XP avalia que, nesse período, o mercado financeiro no Brasil teve desempenho inferior aos pares globais e emergentes. Apesar disso, os ativos brasileiros seguem atrativos, com oportunidades em várias classes.

Influência do arcabouço fiscal

Cortez e Abdelmalack lembram que o arcabouço fiscal também fez preço antes de ser apresentado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, no fim de março. 

Com isso, o cientista político avalia que a questão fiscal foi também um grande precificador do dólar nos 100 primeiros dias de Lula na presidência. 

“Todas as declarações por parte do presidente sobre gastos públicos, disposição para cortar ou não gastos, qualquer elemento que pudesse dar uma ideia ao mercado da agenda que o governo iria tocar fez preço”, diz.

Por outro lado, o arcabouço fiscal que será aprovado no Congresso deixa interrogativas no mercado. Para a XP, muitas respostas sobre o arcabouço fiscal ainda estão em aberto.

Enquanto Cortez reforça que algumas dúvidas em relação a qual projeto será aprovado e os parâmetros por trás do desenho geral que o governo enviou ainda permanecem. 

Apesar das incertezas fiscais que perduram desde o governo anterior, de Jair Bolsonaro, a economista-chefe da Veedha avalia que o Brasil não tem risco de insolvência. “Não estamos em uma iminência de uma crise de insolvência, o que mantém o país atrativo para o investidor e sustenta esse fluxo de investimentos vindo lá de fora”, ressalta.

E os próximos 100 dias?

Para os próximos 100 dias, ou até meados de julho, a equipe da XP acredita que o cenário seja de volatilidade no mercado local já que “muitas respostas estão em aberto” sobre as novas regras fiscais.

Os analistas acreditam que a taxa de câmbio não é menor porque a incerteza fiscal e os ruídos políticos sobre o quadro fiscal pesam, evitando a valorização do real esperada pela balança comercial positiva e pelos preços de commodities favoráveis.

O profissional da Tendências acredita que o desenho geral do arcabouço fiscal reduziu as interpretações mais pessimistas do mercado doméstico. “Porém, ainda assim, falta a aprovação do texto no Congresso e a como será a aprovada”, pondera.

Já Abdelmalack lembra que ainda não está clara a divisão do Congresso em relação às pautas favoráveis ao governo, o que abre espaço para embates entre o poder legislativo e o executivo. 

“Nos primeiros 100 dias, os poderes calibraram os ponteiros. Agora, fica a curiosidade para o que pode ser o novo governo e a atuação do Congresso. Com isso, é esperado que as medidas saiam do papel. É a grande ansiedade”, comenta, não descartando ser um período de volatilidade.