Economia

“3% é pouco”: Lula vence batalha de metas da inflação ao fazer mercado mudar de opinião

16 fev 2023, 13:25 - atualizado em 16 fev 2023, 13:25
Lula
Desde o dia 18 de janeiro, Lula vem criticando abertamente a política monetária do Banco Central e pede revisão das metas de inflação. (Imagem: Facebook/Lula)

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva provou que segue afiado quando o assunto é debate. Em menos de um mês, ele entrou em um cabo de guerra com o Banco Central sobre a Selic e agora sai com a vitória de ter dobrado parte do mercado sobre as metas de inflação.

Lá em janeiro, quando Lula criticou em entrevista a GloboNews que a taxa básica de juros estava muito alta, enquanto a meta de inflação era muito baixa, a primeira reação dos economistas foi de que o presidente não sabia o que estava falando.

“Você estabeleceu uma meta de inflação de 3,7% [a meta estipulada para 2023 é de 3,25%] e quando faz isso é obrigado a arrochar mais a economia para poder atingir a meta. Por que não 4,5%, como nós fizemos?”, disse Lula no dia 18 de janeiro.

Uma possível elevação da meta também era algo rechaçado. A justificativa era de que a atual meta, de 3,25%, está próxima das metas de países desenvolvidos e que era preciso considerar que o mundo passou por um processo inflacionário durante a pandemia.

Mas, após passar dias atacando duramente o Banco Central, Lula parece estar ganhando aliados.

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Selic: Apelo para o empresários

Durante a posse de Aloizio Mercadante no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), no dia 6 de fevereiro, Lula alfinetou os empresários, dizendo que a classe empresarial precisa começar a pedir por juros menores.

“Quando o Banco Central era dependente de mim, todo mundo reclamava. A Fiesp [Federação das Indústrias do Estado de São Paulo] só se pronunciava no dia em que o Banco Central aumentava os juros. Agora não falam mais”, criticou Lula. “No meu tempo, 10% era muito, hoje 13% é pouco. Se a classe empresarial não se manifestar, vão achar que estão felizes.”

Ele não precisou falar duas vezes. Márcio Leite, presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), foi um dos primeiros a concordar com Lula e dizer que não seria retomar a indústria com a taxa de juros em 13,75% ao ano.

Na semana seguinte, a lista foi reforçada pelo economista André Lara Resende e Josué Gomes da Silva, presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).

“A taxa de juros básica hoje de 13,75% está correta? Na minha opinião, não, está profundamente errada”, disse Lara Resende em entrevista ao Canal Livre, da TV Bandeirantes.

Já o presidente da Fiesp disse que “já era para o Banco Central estar cortando mais rapidamente a taxa básica de juros”.

Metas de inflação: Domando os tubarões

Com as opiniões sobre Selic alinhadas, começou a fritura das metas de inflação. O assunto esquentou com a proximidade da primeira reunião do Conselho Monetário Nacional (CMN), o grupo que bate o martelo das metas.

Segundo informações do Broadcast, Lula quer um aumento de 1 ponto percentual na meta de inflação de 2023. Com isso, o centro da meta ficaria em 4,25%, já o teto seria de 5,75%.

O presidente avalia que a mudança permitiria reduzir a Selic para um patamar de 12% até o final do ano, uma vez que a inflação estaria dentro da meta.

No final de janeiro, o Itaú divulgou um relatório no qual projetava que o Banco Central pode elevar a taxa Selic para um patamar de 15% caso a meta de inflação suba de 3% para 4,5% em 2024.

No entanto, ontem, alguns dos gestores mais respeitados do país defenderam um aumento na meta de inflação.

Durante um evento do BTG Pactual, Luis Stuhlberger (sócio-fundador da Verde Asset), André Jakurski (sócio-fundador da JGP) e Rogério Xavier (sócio-fundador da SPX Capital) se posicionaram a favor da visão de Lula.

“Não faz sentido o BC praticar juros reais elevadíssimos para buscar uma meta de 3%”, disse Rogério. Para os especialistas, a discussão da meta é cabível e não implica perda de credibilidade.

Ainda assim, nem todo mundo está convencido. Em entrevista a GloboNews, o economista Armínio Fraga diz que mexer na meta, neste momento, seria jogar a toalha e é preciso dar mais tempo para o Banco Central conseguir controlar a inflação.

Além disso, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, já se posicionou contra a mudança das metas e ele é um dos integrantes do CMN.

Só uma batalha

Apesar da conquista, Lula ainda não venceu a guerra. A decisão das metas de inflação só deve acontecer em junho, se o CMN seguir a sua programação tradicional. E o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já adiantou que o tema não está na pauta do grupo no momento.

O governo também tenta tirar Lula da linha de frente, para não desgastar mais a sua imagem com o mercado, que está com um pé atrás desde a eleição do petista.

Para Rafael Passos, analista da Ajax Capital, antes de discutir uma mudança na meta de inflação de curto prazo, o governo precisa aprovar o novo arcabouço fiscal.

“Diante de uma âncora fiscal factível, a eventual mudança da meta pode ser feita de maneira suave, sem maiores impactos nas expectativas de inflação e taxas longas de juros”, afirma.