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Ivan Sant’Anna: A história de uma relíquia bárbara – Parte 1

27 ago 2019, 14:30 - atualizado em 27 ago 2019, 14:32

Por Ivan Sant’Anna, autor das newsletters de investimentos Warm Up Inversa e Os Mercadores da Noite

Caro leitor,

No início dos anos 1980, abandonei o mercado de ações e de títulos do governo (open market) e passei a me dedicar ao de ouro futuro. Este era negociado na Bolsa de Mercadorias de São Paulo (Bolsinha).

Os preços (inclusive os praticados pela Caixa Econômica Federal nos garimpos) eram resultantes da cotação do metal na Comex, em Nova York, convertida em cruzeiros pelo valor do dólar no mercado paralelo. Como em NY a unidade era onça, e aqui grama, havia uma fórmula de conversão.

Logo me dei conta de que na Comex havia uma liquidez bem maior e passei a operar com mais frequência no mercado americano.

Quase toda noite ficava até tarde estudando as características do ouro e os fundamentos que influenciavam as cotações.

Naquela ocasião, ninguém me classificava como sendo operador de derivativos mas tão somente como trader de ouro.

O curioso (foi uma das primeiras coisa que aprendi) é que o metal foi valorizado desde o inicio da civilização, na Suméria, há aproximadamente seis mil anos. E não foi apenas lá. Cada povo isolado que foi contatado pelos descobridores já tinha o ouro como reserva de valor. Isso aconteceu com os astecas, com os incas e em todos os lugares onde havia jazidas de ouro, ou ouro de aluvião (no leito dos rios).

Como era difícil negociar com pó de ouro ou mesmo com pepitas, os homens cunhavam moedas. Os primeiros a fazer isso foram os lídios, na atual Turquia, no século 7AC.

Ao longo dos séculos seguintes, as diversas potências mundiais (impérios Romano, Otomano e Britânico, Espanha e Portugal), procuravam acumular a maior quantidade de ouro possível, trazendo-os de terras conquistadas.

Dando um formidável salto no tempo, pouco antes do fim da Segunda Guerra, mais precisamente em julho de 1944, na conferência de Bretton Woods, fixou-se uma paridade do dólar com o ouro. Na época, os Estados Unidos possuíam três quartos do ouro (ouro extraído, é claro) do mundo.

Determinou-se que o dólar valia 1/35 de uma onça de ouro. Decidiu-se também a paridade das demais moedas com relação ao dólar. O câmbio tornou-se fixo em quase todas as nações. No Brasil, por exemplo, a moeda americana passou a valer 18,50 cruzeiros.

Nos anos seguintes, a paridade dólar/ouro foi sendo reajustada lentamente até US$ 38,90. Mas, em 15 de agosto de 1971, o presidente Richard Nixon pôs fim ao gold standard.

Iniciou-se o primeiro grande bull market do metal. Curiosamente, fiquei sabendo disso cinco anos antes, durante um almoço na sala de Edmond Safra (ele comeu; eu assisti) no Republic Bank, em Nova York.

Mesmo tendo havido as correções normais de qualquer ciclo do touro, entre 1971 e 1980 o preço da onça de ouro na Comex subiu impressionantes 2.067%, de US$ 38,90 para US$ 843,00.

Veio então a era do dólar. Que se tornou referência de preço para todos os ativos e instrumento de reserva dos países, inclusive os comunistas. Isso porque o Fed, sob o comando de Paul Volcker, praticou uma política anti-inflacionária extremamente contracionista, chegando a elevar os juros para 18,33% (junho de 1981).

O ouro voltou a ser o que era desde tempos imemoriais: uma relíquia bárbara. Continuou, é claro, servindo para fabricação de joias e uso industrial e odontológico.

Amanhã, na 2ª parte deste artigo, falaremos sobre o bear market do ouro que durou 18 anos, até que se iniciou o ciclo atual.

Um abraço,

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